Centro Espírita Maria Magdalena

A RENÚNCIA SEM PROVEITO

Luiz Antônio Millecco, Reflexões do meu além de fora, Ditado pelo espírito Delfos.


Tão logo me refiz do choque biológico provocado pela desencarnação, pus-me em companhia de Rufus a estudar e observar. Percorri câmaras de p reencarnatório, visitei hospitais e enfermarias, tive contato com enfermos desencarnados das mais variadas
procedências.


Um fato, porém, chamou de modo geral minha atenção. Uma senhora aparentando pouco mais de meio século, jazia num leito sofrendo ainda algumas sequelas do câncer que a vitimar no corpo físico. Eram curiosas as vibrações que dela partiam. De um lado sentia-se
que possuía imensa capacidade de amar; do outro lado, havia um quê de esvaziamento em seu psicossoma. Parecia que em algumas áreas de seu corpo suprafísico havia ausência de vida. Algo não circulava, ou se o fazia, era de modo incipiente.


Perguntei com descrição ao meu amigo Rufus se aquela nossa amiga sabia de sua situação. Rufus respondeu-me que sim. Estava plenamente consciente de que já não pertencia ao mundo dos chamados vivos. No entanto, não podia desfazer-se de todo, ainda,
de suas sensações físicas num mundo suprafísico.


Eu próprio havia constatado nos primeiros tempos de minha volta ao Mundo Espiritual que, embora o ego físico seja abandonado, restam, ainda, ego mental e o ego emocional a nos armar ciladas, a fazer com que experimentemos resíduos do ontem, dos quais temos de fazer esforços para libertar-nos.


Sugeriu-me Rufus, que eu próprio conversasse com ela porque de boa vontade ela me explicaria o que se passava.


Aproximei-me e entabulei o diálogo com palavras de simpatia e de saudação em Cristo. Com sua aquiescência interroguei-a sobre a situação que experimentava, e ela me abriu o coração:

– Ah! Meu amigo! Não amei como devia a mim mesmo, nem a meu próximo mais próximo. Fui mãe de cinco filhos e tive de trabalhar para sustentá-los, bem como a um outro parente mais velho. Dentro de mim palpitavam anseios de vida. Todavia, era preciso renunciar e eu renunciei, por isso estou assim.


Estranhei aquela declaração. Que eu saiba a abnegação e a renúncia produzem resultados irreversíveis em termos da evolução espiritual e de crescimento interior. Ali estava, no entanto, aquele Espírito desencarnado a dizer-me que por renúncias estava sofrendo ainda sequelas de seu mal físico.


Ela continuou:

– Não se espante, meu amigo. Renunciei, mas não renunciei. É verdade, sim, que me doei quanto pude. É verdade, sim, que esqueci ou busquei esquecer a mim mesma, no meu trabalho em benefício daqueles a quem me propunha assistir. No entanto, irmão, ai de mim!
Quantas vezes me surpreendi amarga, pessimista, doentia, a lamentar aquela renúncia.


Quantas vezes, desesperadamente, busquei escapar do turbilhão de paixões que se agitava dentro de mim. Quantas vezes, desprevenida, tentei ignorar a frustração que me ruía por dentro. Não era por prazer que eu me dava. Não era com satisfação que eu trabalhava o dia inteiro para que nada faltasse aos meus. Não era alegremente que eu me colocava em último lugar para que prevalecessem as necessidades deles. Resultado: Porque me neguei à Vida, a Vida se seguiu mim. Ao meu passado de sombras trouxe a sombra do meu presente e o meu corpo físico sofreu as consequências dessas vibrações desencontradas. O câncer, inevitável, surgiu e me corroeu o corpo como a frustração que corroía a alma. Em suma, renunciei mas não desapeguei. Neguei-me à vida, mas não me neguei a mim mesma. 

Quem de fato renuncia encontra alimento para os seus gestos no amor àqueles a quem se dedica.

Quem renuncia sabe canalizar a energia de seus desejos na direção de sua renúncia. Quem renuncia não deixa de amar a si mesmo em amando o outro porque se proporciona às alegrias desse amor através da renúncia. É, meu amigo, caí na ilusão de amar o próximo sem
amar a mim mesma. Essa foi minha desgraça.


– E agora? – perguntei. -Como pretende solucionar este problema?

E ela responde:

– Estou sofrendo sério tratamento para libertar-me dos últimos resíduos da doença e, após algum tempo de exercícios de aprendizado, voltar ao mundo para aprender amar-me e amar o outro. Não mais me amarei com o egoísmo da última existência. Mas reconhecerei
em mm as potencialidades divinas de todo ser humano e terei o que dar aos meus irmãos.


Procurei estender minhas mãos àqueles a quem julgava amar, todavia minhas mãos estavam vazias, isentas de calor, isentas de vida. E essa ausência de vida me perdeu. Compreende  agora porque estou nessa situação? Capacidade de amar me faltava, faltava-me, porém,
vontade de amar. Preparo-me agora, para que, de alma lavada, e revestida dessa energia nova, possa eu voltar ao mundo e dar aos meus o amor de que necessitam sem esquecer que eu também existo e devo respeitar a mim mesma como centelha divina e ao meu futuro
corpo como um templo que servirá de habitação a essa centelha.

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